Limites: A importância e a dificuldade de dizer NÃO.

 Caros pais,

Como Psicóloga Clínica recebo todos os dias famílias em meu consultório com diferentes queixas, em busca de auxílio para lidar com seus conflitos e em busca de novas perspectivas. Porém, uma queixa se repete constantemente na rotina de atendimentos: a dificuldade em conseguir que a criança obedeça às regras, ou seja, a dificuldade em estabelecer limites e dizer NÃO.

Mas porque é tão difícil dizer NÃO aos filhos nos dias de hoje? Você se recorda da última vez que disse NÃO ao seu filho?

Vou relatar um exemplo cotidiano que muitos irão se lembrar. Quando ganhávamos um par de meias no Natal (considerado um desastre por nós) ao invés de um carrinho ou uma boneca, éramos incentivados a sorrir e agradecer, mesmo não gostando do presente. Aprendemos a dizer SIM, mesmo quando queremos dizer NÃO. E talvez este fator histórico contribua para a dificuldade de inúmeros pais em dizer NÃO aos seus filhos.

Outro fator que pode estar relacionado com a dificuldade em dizer NÃO é a diminuição de tempo para se dedicar aos filhos. Pai e mãe, na maioria das vezes, trabalham quase o dia todo e fazem malabarismos para dar conta das tarefas domésticas. E de fato podemos notar que o tempo para criação dos filhos diminuiu, mas o prejuízo maior não é o tempo dedicado e sim o sentimento de culpa que os casais apresentam e muitas vezes a forma como tentam compensar: acabam por adotar uma postura mais passiva no momento de estabelecer limites.

Mas como resolver essa situação? A busca por uma receita secreta em sites, livros ou consultórios é uma ilusão. Considerar a ideia de um procedimento padrão para todas as crianças é considerar a existência de uma forma certa ou errada de educar, sendo que na verdade essa forma depende dos valores de cada família. No entanto, vivemos em um momento histórico em que proibir se torna quase proibido, considerando os fatores já citados. Como consequência observamos crianças com pouca habilidade para enfrentar situações difíceis, com baixa tolerância à frustração e com dificuldade para se adequar ao universo escolar.

É importante que os adultos se lembrem de uma premissa básica: não é a quantidade de horas que passam com seus filhos que faz a diferença e sim a qualidade destes momentos. E a qualidade pode ser atingida de forma simples, por meio de uma refeição à mesa aos finais de semana (sem estímulos distratores, como televisão e celulares), por meio de perguntas de como foi o dia da criança, de elogios, sorrisos ou abraços quando a criança apresenta um comportamento bacana e adequado. O importante é gerar boas lembranças!

Mas ter um momento de qualidade também inclui dizer NÃO com coerência, quando necessário e seguido de uma explicação compreensível e objetiva do motivo de não poder se comportar daquela forma. Combinados realizados previamente (com os famosos quadros de incentivos com entrega de recompensas periódicas para a criança) são interessantes. Porém, é importante que as recompensas não sejam sempre objetos (presentes), mas sim momentos de lazer familiar e sempre acompanhadas de conversas que fortaleçam o aprendizado e as relações.

É fato que em algum momento as crianças reclamarão de ouvir NÃO, ficarão tristes e com raiva, mas elas precisam disso e diria (pela observação em consultório) que protestam por isso. As crianças necessitam de limites desde pequenas, inclusive para que não se exponham a perigos. Dizer NÃO para uma criança quando ela tenta colocar o dedo na tomada, já é uma forma de estabelecer limites. Dizer SIM pode parecer uma saída mais confortável, principalmente quando aprendemos a agradar as outras pessoas e sentimos medo de perder o afeto delas, mas negar a necessidade de disciplina promove uma dinâmica familiar com presença de hostilidade e insegurança. Um não coerente prepara para a realidade da vida (que não é gentil, pelo contrário), desenvolve repertório e forma o indivíduo.

Por fim, educar e ser capaz de transmitir valores e regras é o maior desafio dos pais. É um treinamento diário, requer paciência e observação das necessidades da criança, que mudarão ao longo do desenvolvimento. Nem sempre é agradável, dá trabalho, não possui receita, exige cuidado e é um aprendizado constante. É uma verdadeira aventura...

Feliz aquele que transfere o que sabe e aprende o que ensina

Cora Coralina - Pseudônimo de Ana Lins do Guimarães Peixoto Brêtas - Poetisa do Estado de Goiás.